sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Januario Garcia - olhar negro, olhar brasileiro

Januario Garcia

Colômbia, Outubro de 2006. Foto: Januário Garcia

Um nome a conhecer melhor. Mais uma grande personalidade negra.
Inteligente, vivaz , otimo argumentador Januario nos conquisata com argumetos simpatia e charme.
O movimento negro nao precisa ser carrancudo. Nos brasileiros reinvidicamos unindo, abraçando.
Busque Januario. Ele sempre esteve perto de nos e com o seu olhar sobre um povo.

Em: http://www.palmares.gov.br/005/00502001.jsp?ttCD_CHAVE=334

Caçador da BELEZA

Januário Garcia acabou de chegar de Salvador. É uma manhã de sol, num domingo, no Rio de Janeiro. Marcamos a entrevista para às quatro da tarde, na casa dele, em São Cristóvão. Fotógrafo e uma das mais expressivas lideranças negras do Brasil, Januário esteve antes na Nigéria, para fotografar o carnaval da África. Notou muitas semelhanças com a festa de rua de Salvador e resolveu concluir o trabalho na Bahia. São fotos que vão se juntar a um rico acervo que conta a história do movimento negro no Brasil - desde os anos 60. Mas esse não é o único ângulo escolhido pelo ex-menino de rua que um dia trocou Belo Horizonte pelo Rio. A cidade foi generosa com ele. Nos anos 70 e 80, Januário Garcia foi um dos principais fotógrafos das capas dos antigos Long Plays dos grandes nomes da MPB. A foto do urubu em pleno vôo no disco homônimo de Tom Jobim é de Januário, Caetano Veloso no colo da mãe do disco "Muito" também, o Raul Seixas dos dez mil anos atrás também. A lista inclui ainda Chico Buarque, Tim Maia, Belchior, entre outros.

O risonho Januário

O táxi me deixa na porta de um prédio de quatro andares numa rua tranqüila, com crianças nas calçadas. Subo as escadas e sou atendido por Januário, dono de uma risada contagiante. Começamos a conversa por Tom Jobim, "uma pessoa diferenciada", conta Januário. Ele está preparando uma exposição "Instantes Instantâneos" do Maestro, com imagens de Tom e parceiros como Edu Lobo.

Como foi feita a foto do urubu? pergunto. Januário busca na memória o final do verão de 1976. Tom regressava dos Estados Unidos com um disco feito com total liberdade e recursos próprios. Voltou estimulado a conhecer melhor os hábitos do urubu. Passava horas no Jardim Botânico e na Tijuca observando a ave. Quando foi hora de escolher o nome do disco não teve dúvida: "Urubu". O desafio era fazer uma foto do bicho em pleno vôo para ilustrar a capa. Tom pediu ajuda ao filho Paulo Jobim, que tinha uma moderna máquina fotográfica, e foram inúmeras tentativas de registrar o bicho. Com o tempo, chegaram a conclusão de que precisavam da ajuda de um profissional. Tom recorreu então a Januário Garcia. "Ele me disse que "Urubu" era o disco mais bonito que tinha feito e pediu para embalar o trabalho com o coração". Foi preciso também certo preparo físico.

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Com Raul

Raul Seixas é outra personalidade inesquecível. "Ele chegou com um litro de uísque que bebeu em pouco tempo, depois pegou uma garrafa de cachaça de Salinas e também bebeu. Aí disse a ele. Raul, você não tem medo de morrer bebendo desse jeito. Ele olhou o infinito, ficou em silêncio, não respondeu. Alguns minutos depois veio uma resposta que sintetiza toda a criação de Raul - "Januário não tenho medo de morrer, tenho medo de deixar de existir". Januário reforça o mito em torno de outro artista, Tim Maia. "Esse era difícil, a gente marcava a foto, arrumava uma pessoa do tamanho dele para definir a melhor luz, quando estava tudo pronto, toda a equipe esperando Tim chegava e dois minutos depois abandonava o estúdio". "Não vou fazer a foto hoje", dizia o compositor de "Só quero dinheiro".

Não foram só as estrelas da MPB que cruzaram o caminho de Januário. Ele mostra um caderno especial do Rio de Janeiro, com fotos de ângulos pouco vistos da cidade maravilhosa publicado pelo Jornal do Brasil. "Olha só quem escreveu os textos desse ensaio". Vejo o nome de nosso poeta maior - Carlos Drummond de Andrade.

Januário tem olhos de caçador e nasceu para ver a beleza. Quando vivia nas ruas do Rio de Janeiro, ainda adolescente pegou uma pneumonia que quase o levou à morte. "Eu estava no hospital e escutei o médico comentando que tinha poucas chances de vida, na hora juntei todas as minhas forças pela vida. Foi um milagre". Graças a esse milagre, Januário pode traduzir em imagens a música e a poesia do Rio de Janeiro. Antes da despedida, olhamos pela janela do apartamento. Na rua ainda estão as crianças.

- "Repare nas casas, sem muros, e só se fala em violência". O Rio é tranqüilo em São Cristóvão, no final da tarde de domingo. As balas estão perdidas em outros lugares. A cidade que luta contra a violência foi capaz também de transformar um ex-menino de rua em Januário Garcia, caçador da imagem do urubu em pleno vôo, da mãe terra e dos mistérios da existência.

Os homens invisiveis do Brasil

Às
vezes andando nas ruas de Copacabana, me sinto como um fantasma.

Estou ao lado das pessoas, mas percebo que sou uma incômoda presença. Quase os atravesso, q

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Cidadãos de bem, velozes, em suas avenidas mentais. O último tênis, o último corte de cabelo, estão apenas cuidando de si. Ilhas e ilhas.

Ah, como queira que aquele menino com suas bolas de tênis nos surpreendesse com a sua habilidade no saibro. Gugas negros.

Somos milhões. E somos etéreos como o ar, por que como maioria, apenas assim podem nos ser indiferentes. Não pesamos quase nada ( e somos milhões!), nos adaptamos a quaisquer situações ("nós faz tudo dotô!).

Cidadãos de bem. Vejo milhares passarem por mim, e mesmo tendo cumprido um verdadeiro roteiro de cinema eu não estou aqui.

Me olho no espelho da vitrine da loja da esquina. Muito jovem, nem mesmo eu me vejo na minha novela das oito.

Afinal quantos protagonistas negros eu já havia visto?

Um segundo, um milímetro e agarro aquela bolsa, dou um piparote naquele guarda, dou um aú e uma rasteira naqule velhinho. Ah, um arrastão! Um mar como eu, em disparada, algazarra, que meninada!

Mais uma vez quase desisto de tudo. Estou descumprindo o papel que está tatuado em minha pele. Sou um marginal. O fato de estar em condicional não altera o meu crime.