quarta-feira, 18 de abril de 2007

Somos assim: cordiais?

Em BBC Brasil:

Polêmica racial desmascara ilusão de harmonia, diz antropólogo


Ministra Matilde Ribeiro
Para antropólogo, reação à fala de ministra não surpreende
A polêmica criada a partir das declarações da ministra da Integração Racial, Matilde Ribeiro, de que "não é racismo um negro se insurgir contra um branco" é uma reação à quebra de expectativa na sociedade brasileira de que existe no país uma harmonia racial, na opinião do antropólogo João Batista Borges Pereira.

"É como se houvesse um acordo tácito e todos falassem de maneira mais harmoniosa, cautelosas em emitir opiniões sobre o assunto", afirmou Pereira, professor de Antropologia da Universidade de São Paulo (USP) e do Mackenzie e autor de vários livros sobre racismo.

Para o antropólogo, a sociedade brasileira vive na ilusão de uma democracia plena, onde todos convivem em harmonia e as diferenças nunca são explicitadas.

"A fala dela de certa maneira choca por causa disso. Porque desafia este clima muito melindroso, no qual as pessoas entram com muita cautela", diz.

Cautela

Até mesmo no movimento negro, analisa Pereira, o discurso é cauteloso, apenas de reivindicação e de igualdade, sem confronto.

"Não tem uma retórica racista de agressão ao branco. Pelo menos eles não expressam isso. Não é de bom tom", afirma.

"A ministra Matilde começou a falar em uma linguagem que, no Brasil, é tida como um pouco politicamente incorreta", diz. "Este tipo de coisa pode criar uma impressão muito ruim a este Brasil que busca harmonia, e não ódio racial."

A ministra disse à BBC Brasil que entende e considera natural que um negro não queira conviver com um branco porque "quem foi açoitado a vida inteira não tem obrigação de gostar de quem o açoitou".

A entrevista da ministra provocou debate, mas também uma forte reação de condenação às declarações de Matilde Ribeiro. A reação não surpreendeu o especialista. "É mais ou menos o que a gente encontra (em pesquisas). As pessoas condenam este tipo de atitude", afirmou.

Pereira diz que pesquisas de sua autoria e de outras fontes mostram que o brasileiro acredita que existe que racismo no país, mas não se coloca como racista.

O mesmo ocorre, afirma o antropólogo, com as vítimas do racismo: normalmente, as pessoas dizem que o problema existe, mas nunca se colocam como vítimas.

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Os homens invisiveis do Brasil

Às
vezes andando nas ruas de Copacabana, me sinto como um fantasma.

Estou ao lado das pessoas, mas percebo que sou uma incômoda presença. Quase os atravesso, q

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Cidadãos de bem, velozes, em suas avenidas mentais. O último tênis, o último corte de cabelo, estão apenas cuidando de si. Ilhas e ilhas.

Ah, como queira que aquele menino com suas bolas de tênis nos surpreendesse com a sua habilidade no saibro. Gugas negros.

Somos milhões. E somos etéreos como o ar, por que como maioria, apenas assim podem nos ser indiferentes. Não pesamos quase nada ( e somos milhões!), nos adaptamos a quaisquer situações ("nós faz tudo dotô!).

Cidadãos de bem. Vejo milhares passarem por mim, e mesmo tendo cumprido um verdadeiro roteiro de cinema eu não estou aqui.

Me olho no espelho da vitrine da loja da esquina. Muito jovem, nem mesmo eu me vejo na minha novela das oito.

Afinal quantos protagonistas negros eu já havia visto?

Um segundo, um milímetro e agarro aquela bolsa, dou um piparote naquele guarda, dou um aú e uma rasteira naqule velhinho. Ah, um arrastão! Um mar como eu, em disparada, algazarra, que meninada!

Mais uma vez quase desisto de tudo. Estou descumprindo o papel que está tatuado em minha pele. Sou um marginal. O fato de estar em condicional não altera o meu crime.